Parte Três:
O Novo Homem. O que há com ele?
ML: Só para voltar um pouco no assunto dessa "coisa da leitura", eu acabo de começar a entender tudo isso há bem pouco tempo com meu pai. Meu pai sempre lia muito quando eu era pequeno, e eu sempre observava que ele adorava ir à biblioteca e eu sempre ia à biblioteca com ele, e simplesmente ele sumia entre as estantes. Eu ficava andando perto dele e ele ficava muito absorto em um livro. Então eu pensava "Puxa. O papai está mergulhado nos livros. Deve ser uma coisa legal. Vou mergulhar nos livros também." E então, mergulhei nos livros.
E minha irmã e eu, minha que é dois anos mais velha que eu, basicamente fomos criados por minha avó, que veio da Inglaterra para morar conosco. Meu pai e minha mãe trabalhavam em semanas de 40 horas, e quando chegavam em casa ainda tinham jantar para preparar, tudo tinha de ser feito, e o papai só lia. Então existia um certo distanciamento emocional, uma separação ali. Provavelmente desencadeada em boa parte pelo fato de que eles eram ingleses tentando se enquadrar à sociedade americana, embora não sabendo exatamente se integrar a ela. Então, como resultado, todos os seus amigos próximos, na maioria, eram e ainda são outros ingleses, principalmente. O que pode vir a ser um beco sem saída, se você está em outra cultura.
CS: Isso limita a interação social da pessoa.
ML: E muito.
LS: Isso define claramente a aceitação social.
ML: E eu tinha de suportar o peso disso, porque na escola eu era sempre o escolhido, pois não fazia coisas que eram estritamente aceitas como sendo "americanas", e então havia um nível de ostracismo com que eu estava convivendo, e que eu não havia percebido, até muito recentemente: eu apenas mergulhava nos livros.
CS: Isso era o que você achava que devia fazer, porque é o que seu pai fazia.
ML: Exatamente. E então, agora que tenho idade para ver como tudo entrou no lugar certo, ainda existe o abismo ali. Eu tive de trabalhar para o desenvolvimento de todas as minhas aptidões sociais. De fato, me lembro de pensar comigo depois que saí do colégio, quando estava para começar a faculdade: "Bem, eu tive apenas alguns amigos durante minha vida toda. Bons amigos, mas apenas dois ou três. Agora eu quero mais amigos. Vou aprender a ser social. E levei anos para aprender essa coisa. Lembro de meu primeiro ano na faculdade. Sextas-feiras à noite. Sábados à noite. Sentado em meu quarto, esperando alguém bater à porta.
CS: E ninguém batia.
ML: Na verdade batiam. Havia algumas meninas que eu conhecia que vieram uma noite e bateram, e eu não sabia o que fazer. E elas bateram com mais força, e eu pensei na situação do submarino que permanece o mais fundo e imóvel possível no oceano para não ser detectado pelo inimigo no filme "Run silent, run deep", e elas começaram a espancar a porta. De algum modo, sabiam que eu estava lá. Então, foram para o outro lado do quarto e entraram, e eu pensei "Meu Deus, e agora?". Foi ruim, mesmo, muito ruim. Depois, finalmente as pessoas começaram a me levar para sair e eu pensava "Estou com medo do quê? Não sei por que estou com medo disto. Não consigo entender conscientemente por que estou com medo disto." Levei muito tempo para compreender que não havia nada para se preocupar nas interações sociais. No entanto, meus pais haviam sido tão inábeis com isso que
LS: Você superou o medo que seu pai tinha.
ML: Meu pai me contou há apenas alguns meses que houve somente quatro vezes na vida dele em que ele realmente se sentiu em situação desesperadora, o que implica que isso nunca, jamais acontecerá novamente. "Eu tenho uma pequena diferença em relação a todos os outros." O que é uma coisa realmente tangível que percebi, ainda mais desde que ele me contou. Como resultado, já compensei tudo completamente.
CS: É o medo de ter essa diferença, e então você foi na direção oposta.
ML: É, e se tenho algo, são MUITOS amigos.
LS: O que exige muita dedicação e tempo. Eu tenho três amigos. Eu tenho um amigo, não tenho a mínima idéia de onde ele está agora mas, se ele me ligasse amanhã e dissesse "Eu preciso disto, você pode pegar um avião para sei lá onde", eu já estaria no avião. E sem perguntar nada. Ele pode ter alguma pergunta, mas eu não teria nenhuma. Com estes três caras, nós todos investimos muito tempo, e eu sou mais cético agora quanto a fazer amigos do que era há vinte anos. Leva muito mais tempo agora para ser meu amigo do que levava há vinte anos. Apenas estou cansado, cheguei ao ponto em que nem sei se terei seis pessoas para carregar meu caixão, sabe? Quem sabe? (Larry e Cason riem)
CS: Bem, você tem quatro filhos. Já são quatro.
LS: Bem, eles são da família. Ninguém quer que a família carregue o caixão.
Tem uma coisa sobre aquela história da Segunda Guerra Mundial, Malcolm, pela qual seu pai tem simpatia, por causa do alto risco. Uma coisa que eu tenho, que é parte dos conhecimentos e do treinamento em marketing e vendas que tive é que, se você for fazer uma sociedade, uma coisa que eu tenho de ter deixar clara para você é que você pode estar sob risco estando comigo. Eu posso estar sob risco estando com você, e quanto mais rápido ficarmos em risco, mais próximo será o relacionamento em família e profissional.
YJ: Destruição mútua garantida.
LS: Garantias mútuas.
CS: É assim que é juramento nas fraternidades.
LS: E não quero dizer no nível da fraternidade, quero dizer em um nível em que você, Yves, compartilhou com seu pai e, como pai, e que você compartilhou, Malcolm, com seu pai, e que você, Cason, ainda não falou sobre o seu pai.
CS: É porque meu pai também está à mesa.
YJ: Você está em posição difícil, Cason.
LS: Eu entendo isso. E eu não me sentiria à vontade saindo daqui. Mas eu gostaria de saber se seu pai aceitou ou não você como homem.
CS: Não.
LS: Não acho que você pense isto também. Eu acho que esta semana ajudou nisso. Estamos mais próximos do que jamais estivemos, em termos de adulto/pai.
CS: Isto também, você dois não sabem disto, mas esta é a primeira vez que meu pai me visita em algum lugar onde "eu" estou. Eu sempre fui aonde ele estava. Nos encontramos mutuamente em lugares diferentes, como no meu casamento com Julia em Michigan. Mas esta é a primeira vez que o papai e Judy, minha madrasta, vieram me visitar. Julia e eu, ou será que foi por causa do Austin?
LS: Foi a PRIMEIRA vez na minha vida que visitei uma criança
CS: a primeira vez que ele visitou uma criança, eu sou o mais velho deste festival de filhos. Então, foi uma verdadeira experiência ver o que acontece. Eu suponho até que os pais de vocês dois, Yves e Malcolm, ainda moram perto.
YJ: Sim. Que tipo de relações vocês tinham na área, enquanto cresciam? Porque uma das coisas sobre as quais Malcolm e eu conversamos é que nós simplesmente acabamos conhecendo as formas mais extremas de famílias nucleares. Tenho uma ótima de Nova York, no outro lado do país, e todo o restante na Europa, então eu penso que minha mãe e meu pai foram influências fortes demais em mim. Eu não fui temperado por tias e tios e outros parentes, e avós, e assim por diante.
CS: Nunca vivi próximo a nenhuma família grande. A família da minha mãe sempre ficou em Iowa. A família do meu pai ainda está toda no Texas. Eu nasci na Carolina do Norte, nos mudamos para a Pennsylvania e depois para Missouri, e depois para Oklahoma, e por isso eu nunca, na verdade, vivi próximo a nenhuma outra família além de nós. Então, nunca ouve realmente nenhuma outra influência assim. A família era nuclear até minha sexta ou sétima série, e depois virou como que duas famílias, então eu aprendi de meus pais como pessoas de uma maneira muito diferente de muita gente. Certamente, mais do que vocês, caras, porque eu calculo que os pais de vocês ainda são casados.
YJ: Sim, meus pais ainda estão juntos. Tenho amigos que têm tias ou tios ou avós que foram influências enormes em suas vidas, e parece que as personalidades deles são mais bem elaboradas, porque eles têm estas influências realmente muito fortes de outros membros da família que eu não tive nunca, e com o Marcel eu sempre fiquei muito satisfeito, desde que nos mudamos de volta para Seattle, porque meus pais moram a cerca de meia hora e os pais da Sienna moram em Port Townsend, a uma hora e meia.E os avôs, meu pai em comparação com o pai de Sienna, eles são pessoas extremamente diferentes, ambos são muito intelectuais. O pai de Sienna é extremamente orientado pelos sentidos, no sentido de que é um contraponto interessante com o meu pai, e eu me sinto feliz que o Marcel tenha estas excelentes influências dos avôs. Minha irmã, que mora na cidade, ela é realmente uma mulher forte, também. O que é mais intrigante: minha mãe sempre fala sobre a incrível importância da família, e eles se mudaram para milhares de quilômetros longe da deles.
CS: Uma das coisas com que você realmente substituiu a família grande foram os livros. A idéia de experiência masculina, ou maneiras diferentes de viver como ser humano, você teve um pai e depois teve todos os livros que leu, que entraram no lugar de opiniões diferentes, romanceadas ou não.
YJ: Tenho a tendência de amenizar as coisas que obtive com meu pai, porque às vezes penso que talvez elas tenham vindo de algum outro lugar. Por exemplo, pode ser mesmo claro para mim que obtive habilidades sociais da minha mãe e, como você está dizendo, Malcolm, sobre como seu pai sempre estava lendo e eu penso nisso, também. E minha família dava essa importância incrível à palavra e à leitura, e o valor do conhecimento e tudo o mais vem de meu pai, e é uma parte grande do que sou, e o que é importante para mim como ser humano. É como uma reflexão profunda e aplicar o método científico para experimentar e entender as coisas.CS: Para conseguir voltar e dizer "Sim, isto aqui do meu pai eu absolutamente adoro e quero ser assim, bem parecido."
YJ: Penso que é quase um rito de passagem, ser capaz de diferenciar a si mesmo de seu pai.
CS: Não separado, e não confuso. Como se diz "Não sou tão exatamente como meu pai ao ponto de ser confundido com meu pai. Eu não sei quem sou separado de quem meu pai é, e não completamente afastado de quem meu pai é, mas sou deslocado de meu pai. Tenho qualidades de meu pai que compreendem quem eu sou, e as obtive dele. Sou diferente de meu pai por estas maneiras, e isto faz parte de quem sou como ser humano. Destacado, não separado ou confundido.
ML: Eu acho, no entanto, que estes são os mitos atemporais de tudo, desde o filho pródigo até a Odisséia, do retorno dos heróis: você tem de partir para ser capaz de voltar para casa.
CS: O Tao é o Tao de retornar.
ML: Voltar para essa coisa da família grande, percebi há alguns anos que tenho uma porção de amigos homens que não são só da minha faixa etária. Tenho amigos homens que são muito mais novos que eu, uns oito ou dez anos, e tenho amigos homens que são muito mais velhos, uns oito ou dez anos. Então, é quase como se minha súplica por sobrinhos, tios e avôs localmente tivesse me levado a substituir sobrinhos, tios e avôs. Substituir os pais, também.Bryan, por exemplo, que está ajudando a gente a começar esta revista, ele tem 23 e há brechas imensas de experiência entre nós e, embora ele esteja no mesmo nível intelectual que eu, posso vê-lo querendo saber os tipos de experiência pelas quais passei de uma forma muito respeitosa, da mesma forma como percebi essas coisas sobre outros amigos homens que tenho, que têm seus 30 ou 40 anos, em torno de quem eu gravito, só porque eles obviamente sabem tudo aquilo mais do que eu.
LS: Vocês três já me trataram assim, hoje. Vocês me deram um nível de respeito maior do que o nível de camaradagem entre vocês três. Yves e Malcolm tiveram consideração, às vezes, o que é lisonjeiro, mas ao mesmo tempo ficou muito claro que vocês plantaram um nível de reverência: história, e essa reverência da história com o tempo atual. E essa história está sendo representada na vida de todos nós e nos levou, nesta última hora, pouco mais, a conhecer quem é seu pai.
ML: É como aquela citação incrível de Mark Twain: "Quando eu tinha 18 anos, achava que meu pai era o maior imbecil do universo e, quando fiz 21, percebi o quanto ele havia aprendido em três anos."
LS: Cason está em desvantagem, e ao mesmo tempo em vantagem porque eu estou aqui. Sua desvantagem é se ele se sente pouco à vontade pelo que poderia dizer, se haveria retribuição. (Para Cason) Deixe-me garantir a você que não haverá, ok? Porque este é um encontro de mentes, e tem pouco ou nada a ver conosco, em termos de relacionamento. Mas, fora isso, nos concede um nível além em nosso relacionamento como adultos, pois o que aconteceu conosco nesta noite, nos últimos dez minutos, é uma camaradagem entre quatro homens. Deixou de ser algo de consideração. Ok? Quero dizer, eu penso assim. Não sei se todos vocês aqui se sentiram assim ou não. Mas os comentários não seriam mais próximos entre irmãos. Mas, em virtude das idades de meu pai e do pai do Malcolm, o que começou como um grande abismo entre gerações, temos um relacionamento de distancia, e eu sou um intermediário disso. Sou meio que o pai, o filho...ML: ...o espírito santo?
(Uma explosão de risadas.)
LS: Mas, entre ser um pai e ser um filho...
(Neste momento, a garçonete se aproximou e nos pediu para diminuir a bagunça.)
ML: Desculpe-nos.
YJ: Eu já estava achando que ela viria mesmo nos dar uma bronca.
CS: Minha nossa, esse pessoal aqui... Isto é bilhar a sério.
ML: Eles estão treinando para as finais, cara.Parte Quatro: O Novo Homem. O que há com ele?